O VINHO QUE NOSSOS BISNETOS BEBERÃO
16 ago 2016, Posted by Notícias e Artigos inUm Pinot Noir polonês ou um tinto bem encorpado, feito por exemplo com a uva Grenache? Não se espante se tais vinhos vierem a freqüentar a mesa de nossos descendentes até o final de nosso século. Essa é uma das conclusões às quais chegaram vários estudiosos reunidos na Universidade da Borgonha, em Dijon, entre os dias 28 e 30 de março, no simpósio denominado “Réchauffement climatique, quels impacts problables sur les vignobles”.
Desertificação de amplas regiões do planeta, como o continente africano, por exemplo, e os conseqüentes problemas migratórios; degêlo das regiões polares e aumento do nível das marés, etc., são inúmeras as conseqüências nefastas para a vida animal e humana na Terra. Quanto a isso há uma unanimidade universal e urge que os países se mobilizem para evitar a catástrofe. Não se trata simplesmente de defender a Natureza. A Natureza está se lixando para o problema. Ela se adapta, cria outras formas de existir e se perpetuará de uma maneira ou de outra, abrigando em seu ventre baratas, escorpiões e outras espécies mais resistentes às novas condições. O problema é nosso, é humano, é a existência do Homem, como a conhecemos hoje, que está em xeque. Mas isso é uma outra história. Voltemos ao vinho.
É preciso pesar os prós e os contras para avaliar se as mudanças serão ou não maléficas, porém podemos ter como certo que as mudanças climáticas pelas quais o mundo vem passando (e ainda passará) acarretarão mudanças radicais no estilo de nossos vinhos. Para regiões muito frias como o sul da Inglaterra (que vem retomando a produção vinícola) e outras regiões mais setentrionais da Europa, as condições para o plantio da vide sem dúvida melhorarão. Já as zonas mais quentes sofrerão conseqüências negativas. O aumento das pragas devido ao aumento das temperaturas é uma delas.
Outra é o crescimento da irrigação dos vinhedos devido às secas, prática que sem dúvida crescerá, abrangendo mesmo regiões européias na qual ela não é permitida ou então restringida. A canícula de assolou a Europa em 2003 poderá se repetir mais frequentemente. Ela foi positiva para as regiões do norte, mas problemática para as regiões meridionais.
Devido ao problema, a irrigação já se tornou oficial na França. Um decreto datado de 6 de dezembro de 2006 e publicado em fevereiro de 2007 permite a irrigação durante o alto verão, entre 15 de junho e 15 de agosto, embora a irrigação durante todo o ano ainda seja proibida. Métodos de plantio também poderão ser modificados. O especialista em vinhedos espanhóis Gemma Mollevi preconiza a possibilidade de plantar as vinhas mais rente ao solo, de forma a melhor preservar a umidade e proteger as uvas dos raios solares.
Os produtores australianos de todos os tipos de lavoura se mostram bastante preocupados com o aumento das temperaturas numa região já hoje bastante quente. Um ou dois graus a mais parecem pouco mas afetam bastante a produção agrícola de um modo geral. “Com relação ao aquecimento global, a indústria do vinho é o canário na mina de carvão, porque é um dos indicadores mais sensíveis da mudança climática”afirma o viticultor e autor de livros sobre o cultivo da uva Richard Smart. O autor teme também pela queda de qualidade dos vinhos da Austrália.
O que se pode prever é que regiões que produzem os chamados “vinhos de terroir”, zonas tradicionais em que as castas se adaptaram lentamente de modo a se encontrar uma maior afinidade entre a terra e o “climat” , sofrerão mais , pois o estilo de seus vinhos – consagrados internacionalmente – sem dúvida mudará. Como será um Gevrey Chambertin do século XXII? Será ele ainda elaborado com a uva Pinot Noir? Essas e outras questões se colocam agora para a reflexão dos amantes do vinho.
Até chegarmos lá os vinhateiros devem se preparar para uma série de ações de médio e longo prazo, como a mudança de locais de plantio e de cepas , além de repensar o estilo de seus vinhos. Mas uma coisa é certa: o vinho continuará existindo e também o homem civilizado, que é seu sinônimo. Basta que consigamos driblar a barbárie. Quem viver verá.
AGUINALDO ZÁCKIA ALBERT