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JANCIS ROBINSON É APRESENTADA AOS VINHOS BRASILEIROS

16 jan 2004, Posted by degustadoresfronte in Notícias e Artigos

Aquelas pessoas que associam o vinho ao pedantismo e à frescura devem ter ficado muito decepcionados com Mrs. Jancis Robinson: ela é acessível, extremamente simpática e – mantendo a tradição inglesa – tem um refinado senso de humor. Uma das poucas mulheres a ostentar o título de “Master of Wine”, ela é crítica de vinhos do jornal inglês Financial Times e tem sua coluna reproduzida em inúmeros outros jornais pelo mundo, além de ter uma vasta e sólida obra publicada sobre o vinho.

Seu “The Oxford Companion to Wine”, um alentado volume de cerca de mil páginas é uma fonte obrigatória de consulta de todo enófilo que busque uma informação segura , e Hugh Johnson a tem agora, como parceira, na última edição de seu seminal “The World Atlas of Wine”. “Vintage Time Charts” (que me ajudou a entender a evolução dos grandes vinhos na garrafa), “Confessions of a Wine Lover” e “Jancis Robinson Guide of Wine and Grapes” são mais algumas das obras dessa escritora extremamente prolífica.

Trazida a São Paulo para participar do evento gastronômico MAIS.PALADAR, de Josimar Melo, teve, nesses 4 dias, uma agenda de degustações e palestras bastante intensa. No dia 19/11, em evento comemorativo dos 25 anos de existência da Importadora Expand – uma festa muito bem organizada para um grande público de aficionados — conduziu uma degustação de sete vinhos do Novo Mundo no Leopoldo. No dia seguinte, no restaurante Figueira Rubayat, outra degustação, desta vez de vinhos da Península Ibérica, organizada pela importadora Mistral.

Já na MAIS.PALADAR, três outras degustações, “Grandes Tintos da Bourgogne”, “Vinhos que eu adoro” e uma degustação de vinhos brasileiros, para um pequeno público de jornalistas, produtores brasileiros e diretores da SBAV-SP, evento que tive a honra de organizar.

O vinho brasileiro tem sido, até agora, um grande ausente na imprensa e na literatura especializada internacional. Não seria exagero afirmar que tal evento possa se constituir num divisor de águas em nossa história vinícola pois, pela primeira vez, uma figura de projeção mundial, degusta e comenta uma série de vinhos brasileiros. E o que é mais positivo: sai da degustação com uma impressão bastante favorável.

Procuramos mostrar um painel que representasse o que de melhor nossa indústria vinícola produz. Assim, foram degustados os seguintes vinhos:
ESPUMANTES

Salton Brut Reserva Ouro
Chandon Excellence
Cave Geisse Brut
Marson Brut 2002
Valduga Gran Reserva Extra Brut 99

BRANCOS

Salton Volpi Chardonnay 2002
Miolo Chardonnay Reserva 2002

TINTOS

Boscato Reserva Merlot 2002
Perini Tannat 2002
De Lantier Regional 2002 Ametista
Salton Volpi Cabernet Sauvignon 2002
Terranova Shiraz 2002
Miolo Castas Portuguesas 2002
Salton Talento 2002
Dom Laurindo Assemblage 2001
Pizzatto Merlot 1999
Casa Valduga Merlot Gran Reserva 1999
Marson Gran Reserva 1999
Miolo Lote 43 – 1999

As boas referências que tinha a respeito de nossos espumantes foram confirmadas na degustação. Qualificados de “refrescantes e muito bem vinificados”, sua preferência ficou com os três elaborados pelo método tradicional (segunda fermentação na garrafa), pela ordem: Marson Brut 2002, Cave Geisse Brut e Valduga Gran Reserva Extra Brut 99. Bom também o Salton Brut Reserva Ouro. Opinou que esperava mais do Chandon Excellence, que se sairia melhor se fosse elaborado pelo método tradicional.

A respeito dos dois brancos — Salton Volpi Chardonnay 2002 e Miolo Chardonnay Reserva 2002 — observou que não lhe despertaram muita atenção por não terem nenhuma característica marcante, apesar de serem corretos. Julgou-os muito semelhantes aos Chardonnays médios que se encontram no mercado mundial, o que não deixa de ser, se julgarmos bem, uma forma de elogio para nossos produtores, uma vez que ainda não temos praticamente presença nesse mercado.

As melhores impressões ficaram por conta dos tintos brasileiros. Confessou estar esperando provar vinhos muito diluídos, de pouca concentração, e encontrou vinhos bem vinificados e equilibrados, com boa riqueza de aromas e sabores. Apesar da atual voga mundial de vinhos muito alcoólicos e encorpados, que fazem muito sucesso em degustações, gostou do estilo dos tintos brasileiros, mais de acordo com seu paladar por serem mais leves, equilibrados e com maior acidez, muito mais prazerosos, ideais para acompanhar bons pratos.

Gostou, de modo geral, do painel dos tintos e alguns mereceram seus comentários. O Salton Volpi Cabernet Sauvignon 2002, que foi capaz de identificar como o mesmo vinho servido no jantar da véspera, mereceu elogios. O De Lantier Ametista 2002, no seu entender, mostrou ser um vinho leve, mas “interessante e com agradáveis aromas frutados”. O Miolo Castas Portuguesas 2002, da região da Campanha gaúcha, ainda muito jovem e que será engarrafado nas próximas semanas, despertou sua atenção pelo inusitado das castas – afirmando ser esse um bom caminho — e acertou ao afirmar que as videiras deviam ser ainda muito novas. Outro lançamento, também a ser engarrafado proximamente, o Talento 2002, da Salton, um corte Cabernet Sauvignon, Merlot e Tannat , oriundo da Serra Gaúcha, foi avaliado como muito bom e com bom potencial de guarda.
O Perini Tannat 2002, trazido por nosso confrade Sérgio Inglez de Sousa, também a agradou muito. Achou-o agradável e mais macio do que outros que provara de outras regiões. Acredita que poderíamos muito bem disputar o mercado mundial de vinhos dessa uva com nosso vizinho Uruguai. O Pizzato Merlot 1999 talvez devesse ter ficado alguns meses mais no carvalho, disse à produtora, que estava presente. O Miolo Lote 43 1999 foi cotejado com o da safra 2002, trazido pelo produtor, para ver se a presença de Michel Rolland, nesta última safra, poderia ser identificada.
Os maiores elogios ficaram para o Marson Gran Reserva 1999, “fino, com boa estrutura para envelhecer, lembrando um Bordeaux”, opinião que foi compartilhada por seus dois convidados, o casal de chefs franceses Catherine e Christian Constant do restaurante “Le Violon d’Ingres”, um dos melhores de Paris.
O vinho do Vale do São Francisco foi outro destaque. Ela já havia provado, dias antes, outro vinho da região, um corte de Cabernet Sauvignon com Shiraz, produzido numa parceria da Expand, Adega do Vale e a vinícola portuguesa Dão Sul, e elaborado por enólogos portugueses, e havia gostado. O Terranova Shiraz 2002, da Miolo, da mesma região, também agradou por sua boa qualidade e bom preço. Essas qualidades, somadas ao fato de serem produzidos numa região tropical, fato único até agora no mundo do vinho, poderiam constituir num bom apelo caso tais vinhos quisessem disputar o mercado internacional.
Creio que tais impressões possam servir de incentivo aos bons produtores brasileiros para continuarem a trilhar o caminho dos vinhos de qualidade. E, para finalizar, mais um fato importante: alguns desses comentários estão presentes no site da escritora, de grande penetração mundial: www.jancisrobinson.com.br

AGUINALDO ZÁCKIA ALBERT

Publicado na revista VINHO MAGAZINE ed. # 48 – janeiro de 2004

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