Degustadores Sem Fronteiras | A “ANTEPRIMA” DOS VINHOS DOCG DA TOSCANA
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A “ANTEPRIMA” DOS VINHOS DOCG DA TOSCANA

16 ago 2007, Posted by degustadoresfronte in Notícias e Artigos

Tradição e modernidade são elementos que convivem harmoniosamente na Toscana. O cultivo da vinha e a produção do vinho remontam à sofisticada civilização etrusca, que ocupava a região antes ainda da ocupação romana. A vitalidade cultural e econômica da região ao final da Idade Média propiciou um grande desenvolvimento da cultura vitivinícola, fato que chegou até nós graças à abundante documentação sobre as tradições e costumes vinícolas, a mais completa encontrada em qualquer das regiões italianas.

A fama do Chianti, por exemplo, vem de longa data, embora sua região demarcada só tenha sido estabelecida no início do século XVIII, por Cosimo III dei Médici, constituindo-se assim na primeira das regiões demarcadas da Itália. Apesar de tantas tradições, a terra que foi berço do Renascimento deu à luz também ao importante movimento que causou a revisão da legislação italiana do vinho ocorrida no último terço do século passado, permitindo que se acrescentassem novas uvas francesas e mesmo italianas a seu panorama de produção vinícola. Foi nessa época que despontaram para o sucesso nomes como Tignanello, Sassicaia e Solaia.

A Toscana abriga o maior número de vinhos DOCG da Itália. Os três principais deles, organizados em Consórcios, promovem há vários anos sua “Anteprima”, uma mostra de sua mais recente safra a ganhar o mercado mundial. Assim, o Consorzio del Chianti Clássico, o Consorzio del Vino Nobile di Montepulciano e o Consorzio del Vino Brunello di Montalcino, cada qual em sua principal cidade, receberam jornalistas e enófilos de todo o mundo para uma muito bem organizada degustação de seus vinhos, entre os dias 19 e 24 de fevereiro, à qual tive a oportunidade de comparecer.

A primeira parte do evento, promovida pelo Consorzio del Chianti Clássico, aconteceu em Firenze , no prédio da Stazione Leopolda, antiga estação de trem da cidade remodelada para sediar eventos culturais. O amplo prédio, com paredes de tijolo à vista e decorado com muito bom gosto (como seria de se esperar na Toscana), foi dividido em duas partes. Numa delas foram recebidos os inúmeros jornalistas, na sua maior parte vindos da própria Europa (alemães, ingleses, italianos, dinamarqueses, poloneses e russos). O contigente de correspondentes do leste europeu era bastante significativo, confirmando o boom que o vinho vem experimentando nessa região, sem falar nos chineses e japoneses.

O evento fiorentino, neste ano denominado “Chianti Classico Colection”, primou pela boa organização. Numa enorme mesa central estavam dispostos os vinhos dos melhores produtores do Chianti, que eram trazidos em baterias de 4 ou 5, segundo a escolha do jornalista, por sommeliers impecavelmente vestidos. Pudemos assim degustar uma boa parte dos cerca de 500 vinhos elaborados pelos 130 mais renomados produtores do Chianti, confirmando a qualidade da safra de 2005 que ganha agora as prateleiras dos consumidores. No salão ao lado, os produtores serviam o público de enófilos, experts e compradores em suas mesas individuais. A palestra inicial, bastante interessante, abordou a nova safra de 2007 (tida como excepcional e que pudemos também provar) e também os novos métodos que estão sendo implantados para acompanhar a “rastreabilidade” da produção, ou seja, o percurso do vinho desde a uva até o cliente final. Desta forma, todas as informações aparecem em código no selo do vinho.

O otimismo dos organizadores e produtores era evidente devido ao aumento da produção e das vendas, principalmente externas. O esforço pelo aumento da qualidade pode ser medido pela preocupação com os vinhedos que, nos últimos 10 anos, teve 50% de sua área replantada. O moderno e confortável hotel em que nos hospedamos ficava a cerca de 300 metros do salão, o que propiciava pausas para descanso. Além disso, não ficava longe do encantador centro histórico, viabilizando vez por outra a visita a locais imperdíveis como a Galeria degli Ufizzi, com seu fabuloso acervo de arte renascentista, ou à Catedral de Santa Maria dei Fiore e seu imponente Duomo. Afinal, ninguém é de ferro.

Depois de três dias em Firenze, partimos para encantadora Montepulciano para provar seus Vini Nobili. Na verdade, nos hospedamos em Chinciano, cidade vizinha e famosa estação de águas termais, que tinha mais estrutura para abrigar os visitantes. O evento teve início com um excelente jantar oferecido aos jornalistas e produtores oferecido pelo Consorzio del Vino Nobile di Montepulciano, representado por seu presidente Luca Gattavecchi, onde pudemos degustar boa parte dos vinhos que seriam servidos no dia seguinte.

A prova seguinte prosseguiu na quinta feira, na ampla estrutura coberta armada na Piazza Grande e no Palazzo dei Capitano. O enólogo francês Christophe Olivier abriu o conclave (alguns italianos não esconderam seu desagrado diante do fato) com uma degustação de três vinhos da última safra (2007), todos com muita estrutura e muito boa qualidade. A degustação para os jornalistas seguiu nos mesmos moldes da de Firenze, com muitas boas surpresas. Um intervalo nos permitiu visitar um desses produtores, a vinícola Poggio alla Sala, uma pequena e bem cuidada azienda localizada a 8 km de Montepulciano. Após a visita pude voltar à Locanda del Vino Nobile de Montepulciano, talvez o melhor restaurante da região, e rever meu caro amigo, o simpático chef Rosário. A bisteca alla fiorentina estava irrepreensível e teve como parceiro alguns dos melhores vinhos locais.

Mas Montalcino nos esperava e lá chegamos na sexta feira. A cidade estava em festa e tudo era alegria. Afinal, ainda não havia eclodido o escândalo que envolveu quatro dos principais produtores da região, por adição indevida de uvas de outras regiões e variedades ao lendário Brunello di Montacino. Mas isso é outra história. Para minha alegria pude, pela primeira vez, me hospedar em um pequeno hotel dentro das muralhas da cidade histórica, e lá fiquei por quatro inesquecíveis dias. Montalcino rivaliza com Montepulciano em beleza (e provavelmente ganha), mas é maior e mais cheia de vida. Além disso, seu vinho é, juntamente com o Barolo, o grande ícone italiano.

O Consorzio del Vino Brunello di Montalcino mostrou seus Rossi di Montalcino safra 2006 e seus Brunelli di Montalcino safra 2003. A safra de 2006 foi considerada “cinque stelle” pelos críticos e os Rossi di Montalcino estavam realmente muito bons, o que já é um prenúncio do que será o Brunello da mesma safra. Os Brunelli da quente safra de 2003 também agradaram e já tinham 50% de sua produção vendida antes de seu lançamento na mostra, ou seja, antes do final de fevereiro. A fraude descoberta em alguns Brunelli em final de março — inclusive por ocasião da Vinitaly – pode ter afetado de alguma forma o sucesso da safra. Quanto à safra do Brunello de 2007 (ainda não engarrafada e que provei en primeur), está sendo considerada por todos como “fora de série” e de “alto nível”, um vinho destinado a uma longa guarda. Resta esperar até 2012, quando chegará às prateleiras das lojas.

A mostra aconteceu na Fortezza di Montalcino, antiqüíssima cidadela fortificada situada às portas da cidade murada, bem próxima ao centro histórico. Sendo indubitavelmente a região mais rica da Toscana vitivinícola, Montalcino ofereceu aos visitantes uma festa de alto nível e muito bem organizada. A cidade é considerada, na Itália, um modelo de integração cultural e racial, tendo 11% de seus habitantes de países estrangeiros.

O Brunello di Montalcino DOCG é um sucesso mundial e conta com um inteligente marketing para apoiá-lo. A produção média anual é de 7,1 milhões de garrafas, das quais 60% são exportadas. EUA (25%), Alemanha (10%), Suiça (7%), Canadá (5%), Inglaterra (3%) e Japão (3%) são os principais mercados. A região também produz os vinhos Rosso di Montalcino DOC (5,5 milhões de garrafas), Moscadello di Montalcino DOC (80 mil), San´Antimo DOC (700 mil), Super Toscanos ( 500 mil) e IGT (3,5 milhões de garrafas).

AGUINALDO ZÁCKIA ALBERT

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