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Se a crise econômica que eclodiu há um ano atingiu o Brasil como se fosse uma “marolinha”, o mesmo não pode ser dito da maior parte dos mercados mundiais. Ali as metáforas climáticas ganham outros nomes, de tempestades a tsunamis, variando de país para país. E a região que melhor simboliza os vinhos de luxo dessa vez não saiu ilesa.

Durante muitos anos os vinhos da região de Champagne tem tido uma progressão ascendente pelo mundo. Enquanto os vinhos de outras regiões da França enfrentavam grandes dificuldades para exportar seus vinhos, o champanhe mantinha-se impávido, crescendo sua produção e suas vendas a cada ano sem baixar seus preços. Mesmo quando o governo francês mostrou-se, sabiamente, contra a invasão do Iraque e os produtos franceses – principalmente o vinho — sofreram um forte boicote no mercado americano, o champanhe manteve firme a sua posição nesse enorme mercado graças a seu prestígio e ao fato de ser considerado um espumante único.

Mas o mundo dá voltas e as coisas mudaram, e como mudaram…Me recordo que no primeiro semestre do ano passado (2008) havia escrito um artigo nessa mesma revista Adega sobre os grandes cuvées de Champagne. A matéria tratava justamente de uma onda de lançamentos de champanhes de alta gama, produtos de luxo e de preços caríssimos. Esses néctares iriam atender os consumidores que fizeram fortuna durante a “ bolha econômica” não só nos EUA mas em todo o mundo.

Pois bem, a situação mudou radicalmente e, dentro do mundo vinho, os produtores de Champagne foram os que mais sofreram. As vendas despencaram a ponto de os produtores da região fizessem um acordo de colher 32% menos quantidade de uvas do que o previsto. Para controlar seus estoques e manter os preços, milhões e milhões de euros em bons cachos de uvas serão deitados por terra e apodrecerão. Essa e outras reduções programadas farão com que, por exemplo, produtores como a LVMH, líder mundial no mercado e que produz a Moët & Chandon e a Veuve Clicquot, entre outros champanhes, tenham em 2009 um corte de produção de garrafas da ordem de 44%. O fato foi noticiado agora em setembro pelo jornal francês Le Figaro e também pelo novaiorquino The Wall Street Journal.

Após um recuo de vendas de 5% no ano passado, a baixa de 2009 , de janeiro a julho, chegou a 23%. As medidas de redução de produção tomadas pelo CIVC, o Comité Interprofessionel des Vins de Champagne, prevêem uma produção de 229 milhões de garrafas, contra as 389 milhões de 2008. Do lado dos viticultores, haveria uva suficiente para se produzir até 297 milhões de garrafas.

Desde 1955 não acontecia uma queda significativa de produção na região. Mesmo assim, a queda desse ano foi devida a causas climáticas (fortes tempestades na colheita) e não econômicas, como agora. E pensar que está em curso a implantação de um plano que visa aumentar a área da zona AOC de Champagne, que tinha em vista um mercado consumidor eternamente ascendente. Tudo leva a crer que esse projeto seja esquecido por um bom tempo.

O champanhe, ao contrário da maioria dos outros espumantes, é uma bebida essencialmente cara. As terras da região são caríssimas, o quilo da uva idem, e o processo muitas vezes artesanal de uma segunda fermentação na garrafa são apenas alguns dos fatores que compõem seu preço. A substituição do champanhe por outros espumantes mais baratos e inferiores se faz sentir de forma mais dramática no mercado norte-americano, onde espumantes de preços que não ultrapassam os U$ 8,00 tiveram um grande aumento de vendas.

De nossa parte, felizes consumidores, a situação não muda. As festas de fim de ano estão chegando e a mais festiva das bebidas continuará à nossa disposição praticamente aos mesmos preços. Além disso, para aqueles que quiserem gastar menos, estão disponíveis os cada vez melhores espumantes brasileiros, além de outros das mais variadas regiões produtoras. Mas champanhe é sempre champanhe.

Aos vinhateiros de Champagne, no entanto, resta se recordar da famosa frase de Napoleão, o mais famoso apreciador da bebida, que dizia beber champanhe sempre pois “ na vitória, você merece beber champanhe, na derrota, você precisa dele”. Como se pode ver, em 2009 os produtores beberão para afogar as mágoas…

AGUINALDO ZÁCKIA ALBERT