HARMONIZAÇÃO,
O MELHOR VINHO PARA ACOMPANHAR SEU PRATO
AGUINALDO
ZÁCKIA ALBERT
O vinho é, sem dúvida, a melhor de todas as bebidas para
acompanhar os mais variados pratos. Graças à sua grande
diversidade e riqueza de aromas e sabores, o prato sempre ganha alguma
coisa quando se faz a escolha acertada do vinho para acompanhá-lo.
Na verdade há uma sinergia entre ambos, vinho e comida, quando
bem casados, propiciando um prazer muito maior do que quando ambos são
degustados separadamente.
O perfeito casamento do vinho com a comida é um tema que gera
algumas controvérsias. A diversidade de vinhos e pratos é
muito grande e as combinações possíveis muito variadas.
É certo que existem critérios técnicos, algumas
regrinhas básicas a serem seguidas, mas a isso devemos somar
as tradições culturais da gastronomia dos grupos humanos.
O conceito básico para se fazer a harmonização
é o bom senso, que deve guiar sempre a ação, de
forma a haver equilíbrio entre o vinho e a comida. Dessa forma,
cada termo da equação deve se equilibrar com o outro,
de tal forma que o vinho não sobrepuje o prato, e vice-versa.
Preste também atenção ao molho, ele pode fazer
toda a diferença. Um peito de frango na chapa, temperado com
ervas, é muito mais leve do que um substancioso Coq au vin, e
por isso pedem vinhos diferentes.
Algumas
regras gerais podem ser úteis, todas elas buscando a harmonização
por semelhança:
1
-Vinhos com aromas discretos > Comida pouco condimentada
2 -Vinhos com aromas potentes > Comida com boa presença aromática
3 -Vinhos jovens e frutados > Pratos simples e rústicos
4 -Vinhos de guarda evoluídos > Pratos refinados
5 -Vinhos leves > pratos com molhos magros
6 -Vinhos mais estruturados > Pratos com molhos suculentos
A
cor do vinho, que deve ser semelhante à da comida, é também
uma regra válida na maioria dos casos.
Dessa
forma, um belo e aromático Gewürztraminer da Alsacia acompanha
muito bem pratos, também aromáticos, da cozinha tailandesa
(regra 2); assim como um jovem e descomplicado Malbec escolta muito
bem um bom churrasco (regra 3). Já um Osso Buco fica divino ao
lado de um bom Barolo (regra 6).
É
interessante notar que a tradição cultural dos povos geralmente
obedece a essas regras. O Cassoulet, por exemplo, prato suculento que
lembra uma feijoada (só que de feijões brancos), pede
tintos robustos, seguindo a tradição desta região
do sudeste da França. Um Cahors ou um Madiran, vinhos regionais
com bom corpo e boa tanicidade, são os indicados. Considere a
alternativa mais econômica de um bom Tannat uruguaio ou brasileiro.
Também
com o Coq-au-Vin a tradição cultural se impõe.
Este delicioso prato da Borgonha tem seu melhor acompanhamento nos tintos
da região: um Gevrey-Chambertin, por exemplo, ou um Borgonha
genérico. Outros vinhos feitos à base da agora badalada
uva Pinot Noir (é o efeito Sideways!), da Nova Zelândia
ou do Chile, também fazem boa figura. Na panela, utilize o mesmo
vinho apenas se o dinheiro estiver sobrando. Um honesto tinto nacional
ou chileno resolvem a questão, mas nunca use um vinho ruim para
cozinhar.
Um
terceiro exemplo de harmonização perfeita consagrada pela
tradição cultural é a Bouillabaisse, um ensopado
de peixes e de frutos do mar, muito consumida no Midi francês.
A pedida aqui é um vinho rosé seco (mandando para o alto
todos os preconceitos) da Provence ou do Rhône.
Para
falarmos de um caso mais comum, vale citar o bom “Spaghetti da
Mama “, com molho ao sugo, dos alegres dias de domingo, que pede
um tinto leve, um Valpolicella ou um tinto nacional de bom produtor
(regra 5).
Em
alguns poucos casos, a harmonização vinho/comida pode
ser feita por OPOSIÇÃO. Nesse caso, o AÇÚCAR
atenua a ACIDEZ; a ACIDEZ atenua a GORDURA e a SUCULÊNCIA equilibra
o TANINO.
O
Foie Gras acompanhado de um Sauternes é um exemplo clássico.
Temos aqui um prato salgado e gordo perfeitamente equilibrado por um
vinho muito doce e – o que é fundamental – de boa
acidez. O resultado é a sinergia perfeita. Também o doce
e potente vinho do Porto é perfeito ao lado de um queijo forte
e salgado, como o Roquefort, o Gorgonzola ou o Stilton.
Mas
não é com absolutamente tudo que o vinho vai bem. Ele
“briga” com amendoins, saladas cruas com vinagre, sopas
leves (afinal, para que tanto líquido junto?) e peixes e mariscos,
neste caso um “veneno” com tintos muito tânicos. Juntos
deixam um sabor metalizado na boca.
Convêm
lembrar que tais conceitos dizem respeito ao “melhor dos mundos”,
onde nada falta e se pode dispor de tudo. São pequenas regras
que nos orientam para uma refeição ideal. Mas cuidado
para não exagerar. Em certas circunstâncias, o único
vinho que dispomos não é totalmente adequado ao prato;
nesse caso se a comida e o vinho são bons, é a hora certa
de quebrar as regras e se lembrar da famosa frase que estudantes franceses
escreveram nos muros de Paris durante seus protestos , e que Caetano
Veloso aproveitou para sua canção: “É proibido
proibir!”.
SUGESTÕES
DE HARMONIZAÇÕES
Entradas
e saladas
Saladas com vinagre: água
Carpaccio: espumante, tinto leve
Ostras: Chablis, Sancerre, Champagne
Salmão defumado: Riesling, Poully Fumé
Salmão fresco: Chardonnay, Riesling
Presunto e embutidos: Beaujolais Villages, Pinot Noir
Mortadela: Lambrusco seco
Presunto cru: Jerez fino ou tinto frutado (Barbera, Dolcetto)
Peixes
e frutos do mar
Bacalhau: Branco amadeirado ou tinto jovem (Chinon, Merlot nacional)
Frutos do mar: Brancos leves secos sem madeira (Muscadet sur lie, Vinho
Verde)
Truta: Brancos secos de médio corpo (Chablis, Riesling alemão)
Peixes leves: Brancos secos leves
Peixes com creme de leite: Brancos secos médios ou encorpados
(Chardonnays do Novo Mundo)
Sushi/sashimi: Champagne brut, espumante nacional, Prosecco
Aves
Pato: Tinto de médio a bom corpo (Bourgogne, Cote du Rhône,
Shiraz australiano)
Pato com laranja: Branco aromático
Perdiz recheada: Borgonha tinto
Coq-au-vin: Bourgogne bem estruturado, Pinot Noir do Novo Mundo
Massas
Pizza e massas com molho ao sugo: Tinto leve ou médio (Valpolicella,
Chianti)
Massas com frutos do mar: branco leve (Sauv. Blanc, Pinot Grigio, Soave)
Carnes
Coelho: Tinto médio
Cordeiro: Bordeaux tinto, Rioja, Cab. Sauv. chileno
Caça: Borgonha tinto
Fondue bourguignone: Tinto médio (Bourgogne, Cab. Sauv. Brasileiro)
Fígado: Tinto leve, jovem (Beaujolais)
Vitelas: Branco médio ou tinto leve
Cassoulet: Cahors, Vacqueyras
Porco: Branco suave ou tinto leve
Steak au poivre: Syrah
Queijos
Fondue de queijo: Riesling, branco seco
Roquefort, Stilton, Gorgonzola: Porto ou branco doce
Queijo de cabra: Branco seco leve(Sancerre, Sauvignon Blanc)
Camembert, Brie: Merlot
Sobremesas
Chocolate: Banyuls, Porto
Tortas (frutas): branco suave
Cheesecake, cremes: branco doce, Sauternes, Muscat de Rivesaltes
Crême brûlée: Sauternes, Muscat, Jurançon
Nozes: Porto Vintage ou Tawny
Publicado
na revista AC CAVES # 02, Agosto de 2005